A PADROEIRA DE PADORNELO: QUEM FOI SANTA MARINHA
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Por: Jofre de Lima Monteiro Alves
Deus fizera o Mundo, uma lufa-lufa de seis dias, ao sétimo botou um olho à sua obra, o resultado era satisfatório.
Mas lá na sede do Céu, reparando bem e de perto, com olho de ver, apercebeu-se que o homem sozinho, a carregar tristeza, bocejava uns dias e noutros levava a morte na alma, triste anacoreta no Paraíso, vadiando desde manhã até sol-pôr.
Tamanho isolamento, a agravar a solidão da condição humana, não era coisa boa, pensava enfaticamente, urgia medidas, mais um pequeno retoque na sua obra-prima.
Certo dia, como sabemos desde os tempos bíblicos, induziu um profundo sono em Adão e retirou-lhe uma costela, perfeita arte cirúrgica.
Até aqui a narrativa é sobejamente conhecida, mas nem todos têm a fortuna de ter acesso à verdadeira história da concepção da mulher, um segredo de antanho felizmente na posse das gerações minhotas e que me foi confiado há meio século pelas minhas mãezinhas Especiosa e Esmeralda – na minha infância as avós recebiam o tratamento carinhoso de “mãezinha”, uma ternura.
Estávamos no ponto em que fora extraída a costela. Nesse exacto instante quando se aprestava para dar forma à mulher, uma raposa lampeira, lesta e manhosa, autêntica desmancha-prazeres, dum salto rouba-lha e deitou a fugir às de vila-diogo.
S. Miguel Arcanjo que a tudo assistia extasiado, enlevado num ai-jesus, ainda teve uma parcela de reacção, deitou a mão ao rabo da zorra trinca-pintos, porém este rebentou na bulha que se seguiu, conseguindo reaver somente um pequeníssimo fragmento da costela.
O resto, um naco enorme, serviu de fino banquete nas entranhas da raposa, tasquinhava à boca cheia, um festim!
Reinduzir o sono e tirar outra costela ao pobre do Adão era inaceitável, parecia amaldiçoada ao insucesso a ideia de dotá-lo de companhia neste vale de lágrimas, seria coisa de fim do mundo. Mas quem tem a omnipotência, além da suprema arte e engenho criativo, rapidamente encontra uma solução. Faça-se a vossa vontade!
Misturou o quinhão da costela e a cauda, muito bem amassado, moldou até estar plenamente satisfeito e insuflou-lhe o sopro da vida, e pronto, nascia assim a mulher, osmose da costela do homem e do rabo da raposa, um regalo, sublime milagre!
Esta alegoria bíblica da criação da mulher visa a finalidade única de incutir no homem o respeito merecido pela companheira tirada da sua própria carne, na contemplação do Senhor.
Porém, a lenda minhota acrescenta um dado importantíssimo, repetido na milenar sabedoria popular, velho como as barbas de Noé: «a raposa tem a manha de sete homens, mas a mulher tem a manha de sete raposas».