Notas e fonética de Jofre de Lima Monteiro Alves
(Versão minhota do século XIX, com exacta transcrição fonológica)
Istória da Nau Catrineta
Eu bo-la qéro còntar;
Trinta anos e um dia
Séimpre à beira do mar.
Nũ habia qe comer
Néim tampouco que gastar;
Butáro solas de môlho
Pra domingo jêintar.
As solas éro tão rijas,
Não nas pudéro tragar;
Butáro sortes a ber
Qáis s’habia de matar,
Caiu a sorte prumeira
No capitão-general:
– «Arriba, arriba, gàgéiro,
Àqele tope real!
Ber se bês terras de Espanha,
Ou aréias de Portugal!»
– «Àlbiças, meu capitóum,
Já béijo terras de Espanha
E aréias de Portugal.
Taméim béijo três donzelas
À sombra dum laranjal;
A mais noba ‘stá a coser
E a tchigante ‘stá a bordar,
E a mais bela d’elas todas
Por seus páis ‘stá a tchorar.»
– «Todas três sóum minhas filhas,
Todas três t’as hei-de dar:
Uma pàra te bestir,
Òitra pàra te calçar,
E a que mais bonita fôr,
Pàra còntigo casar.»
– «Nũ quero as tuas filhas,
Deu’las deixe béim fadar.»
– «Darei-te tanto dinheiro
Qi o não possas contar.»
– «Eu não qero o seu dinheiro,
Qe le custou a ganhar.»
– «Dou-t’o meu cabalo branco
Pàra tu o felutriar.»
– «Eu não quero o seu cabalo,
Qi é de bòcê passiar,
Qero a Nau Catrineta
Pàra no mar nabegar.
Q’assim cumo ‘scapou desta,
Doitra há-de ‘scapar».